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As exportações que abrem a porta do Casarão Truppel

Um dos maiores casarões do centro histórico da cidade já foi uma casinha de pedras, cal de conchas e óleo de baleia. A pequena propriedade pertencia a família Fonseca, mas já entre 1930 e 1940 o imóvel assumiu a forma de sobrado em estilo colonial. Ali funcionou por um curto período de tempo a sapataria de Alexandre Mattar. 
A construção da esquina entre as ruas Marechal Floriano Peixoto com o Largo Almirante Rêgo não durou muito nas mãos de outros proprietários e a história, que se tem conhecimento, começou a ser escrita com a chegada da família Truppel. O primeiro da linhagem a pisar na construção foi Bernardo João Truppel. 


Ele era considerado uma das grandes figuras francisquense da época, já que era um dos sócio-proprietários de uma conceituada empresa marítima da cidade, a Basílio Corrêa & Truppel Agência Marítima, que estava na ativa desde o início do século XX. Entretanto, quando Basílio Corrêa - o outro sócio - faleceu, a companhia passou a ser chamada de Agência Marítima Truppel Ltda.


O velho Truppel era uma pessoa ambiciosa e isso ficou evidente quando começou a reformar a casa recém-comprada. Ele demoliu parte da antiga estrutura e construiu um sobrado no lugar, o que gerou muita polêmica na época. Mesmo possuindo um grande terreno, a obra ultrapassou os limites da propriedade e invadiu a via pública. Com essa alteração no projeto, a prefeitura embargou a construção.


Contudo, como Bernardo não levava desaforo pra casa, ele foi irredutível nos desenhos arquitetônicos da sua futura moradia e ameaçou se mudar para Joinville com sua empresa. Apreensivo de perder os impostos que a companhia gerava à cidade, o prefeito da época, José Alves de Carvalho, permitiu a construção inusitada do sobrado, modificando para sempre o formato da rua no local. As obras acabaram em 1942 e, logo em seguida, a casa foi inaugurada. 

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O empresário era viúvo e se mudou para o imóvel com os dois filhos, Inah e Ogê. Ele não ficou sozinho por muito tempo, logo as novas paredes presenciaram uma nova história de amor, protagonizadas por Bernardo e Maria Isabel Correa, a filha de seu falecido sócio. Deste casamento, nasceram Elda e Bernardo João Filho. Assim como grande parte dos empreendimentos locais, a Agência Marítima Truppel Ltda funcionava no patamar inferior, enquanto a residência ficava com o andar superior.


A firma além de ser reconhecida no cenário local, ganhou espaço nas cidades da região, com filiais em Joinville, Itajaí, Paranaguá, Antonina e até Curitiba, fora os serviços prestados em Florianópolis e Laguna. Era uma potência na economia francisquense, firmando parcerias com grandes empresas do setor marítimo argentino e alemão. Com isso, o nome Truppel se tornou um dos mais influentes da sociedade francisquense.

 
A ascensão da empresa viu um precipício no meio do caminho. Com o falecimento de Bernardo João Filho em 1968, a agência foi extinta. O sobrado imponente permanece até hoje na família, sendo os atuais proprietários os netos do velho Truppel, Jorge Luiz - conhecido como Bizuca - e Izabela Freitas Truppel Schmidt.


Em homenagem a aquele que elevou o nome da família, por muito tempo o casarão exibiu em sua fachada a assinatura de Bernardo Truppel. Mesmo décadas depois da reforma polêmica, muitos elementos permanecem os mesmos daquela época. Os pisos de madeira taco são encerados e os móveis com detalhes incrustados são exibidos, são itens como esses que fazem esquecer o presente e se prender no passado.

A casa grande que se tornou o berço dos Truppel e virou palco principal dos mais diversos acontecimentos cotidianos daquelas pessoas. O historiador e marido de Izabela, Oscar Schmidt, chegou depois na família, mas logo criou memórias inesquecíveis por ali.


A construção acompanhou a evolução da família com o tempo. Ela presenciou nascimentos, choros de despedida e casamentos, sendo que um deles foi de Oscar e Izabela. Há mais de 20 anos, o casal disse sim entre as paredes grossas da casa. E não foram só eles que casaram ali, a festa de Jorge Luiz - Bizuca - e Iracema Carvalho também encheu o sobrado de convidados. 


Diferente de sua companheira, Oscar não cresceu em um bairro histórico, mas sempre cultivou um amor pelo passado e suas atribuições. Ao se mudar para a residência da família, ele começou a aprender algumas características inexistentes para quem mora em outras localidades. Como o centro histórico da cidade é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, existe uma série de regras que precisam ser seguidas em casos de reforma, pintura ou mudanças estruturais. Essas exigências fazem com que as características do local  sejam conservadas. 


Muitas pessoas acabam se mudando dali porque as casas não possuem garagem e existe uma série de burocracias para que reformas no imóvel sejam permitidas. Por isso, Oscar ressalta o alto número de casas abandonadas e até deterioradas ao redor. O centro é um dos locais mais bonitos da cidade, mas ele acredita que o local é deixado um pouco de lado e não é tão valorizado pelo setor público e pelos próprios francisquenses. 

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“O centro tá morrendo. Ele está envelhecendo junto com seus moradores. A comunidade que antes era muito grande, hoje está pequena. Não existem mais tantas crianças morando por aqui, a maioria dos mais jovens está acima dos 30 anos” - Oscar Schimidt

Com certa nostalgia na voz e como se seu olhar estivesse vendo a narrativa pretérita contada, ele viaja para 1981, quando chegou em São Chico. Lembra que a pracinha era lotada de crianças brincando entre as árvores, que as risadas preenchiam o silêncio e que alegria e a vida pareciam fluir pelas ruas. Oscar destaca o contraste entre o passado com a atualidade, em que jovens saem da cidade em busca de outras oportunidades, seja de emprego ou estudo. 

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Apesar de todas as questões levantadas, o historiador não trocaria sua morada por outro lugar. Ele acredita que com investimento apropriado, a cidade, que já é uma potência turística, pode alavancar no mercado nacional. 


Muitos elementos foram modificados com a passagem do tempo, seja pela ação humana ou falta dela. O imponente sobrado Truppel permaneceu de pé ao longo dos anos e acompanhou de camarote as alterações feitas ao redor da Baía Babitonga. Sua história se entrelaça com o auge econômico da cidade. A queda da agência marítima é concomitante à estagnação econômica municipal e a construção guarda, ansiosamente, o renascimento do capital local, almejando, quem sabe, voltar a ter relevância no cenário francisquense. 

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