O sapateiro

Os boatos correm soltos pela cidade e um deles conta a história de um velho morador. O homem de origem portuguesa escolheu São Chico para chamar de lar. Ele era muito conhecido na região pela sua simplicidade e humildade, mas principalmente pelo seu trabalho excepcional com os sapatos.
Todos os calçados que passavam por ele ganhavam um brilho diferenciado, muito até diziam que ele fazia mágica e milagre durante o ofício. Quando não estava em sua sapataria, colocava-se a caminhar. O hobby o ajudava a relaxar e a espairecer quando o trabalho ficava demais. A caminhada era sua terapia e descobrir novas rotas de passeio sua diversão.
Em uma dessas procuras, ele encontrou a entrada do Morro do Pão de Açúcar e não demorou muito para o local virar o seu preferido. Isolado do fervo do centro e longe da demanda do trabalho, aquele lugar se tornou o seu refúgio.
Com o passar dos anos, o português viu seus produtos ganharem o gosto da sociedade francisquense. Os sapatos fabricados por ele logo se tornaram tendência entre os moradores e as encomendas chegavam aos montes. Com isso, o estrangeiro passou a integrar a pequena fatia da burguesia local.
Acompanhado da riqueza, a inveja também passou a rodeá-lo. Seu vizinho era o principal questionador da origem do dinheiro e acreditava fielmente que o homem não merecia o grande reconhecimento que tinha. Certo dia, bisbilhoteiro do jeito que era, o vizinho resolveu seguir o sapateiro.

Era um daqueles dias sucateado de tarefas, sem tempo para descanso e muito menos para caminhar. Entretanto, não conseguindo encontrar o foco necessário para o trabalho, o sapateiro decidiu que seria melhor andar até seu porto seguro para relaxar e ficar o mais longe possível dos sapatos, linhas de costura e, principalmente, pessoas. Mal sabia ele que, desta vez, o refúgio contaria com a presença do silêncio, da mata e, é claro, do vizinho.
Conhecendo as trilhas do morro como ninguém, o português logo se aventurou pela mata fechada. Para não perder o rastro dele, o perseguidor foi atrás. Ele foi guiado até uma gruta e, ao tentar entrar, uma enorme serpente surgiu. Ela era guardiã do local e não deixava qualquer um adentrar a caverna misteriosa.
Assustado e preocupado com o que lhe aconteceria se ficasse diante da feroz criatura por mais tempo, o vizinho saiu correndo e nunca mais se atreveu a retornar. Todavia, o medo não selou a boca do curioso. Apavorado do jeito que estava, tratou de contar os eventos inusitados que tinha presenciado.
Com a história circulando pelas ruas da cidade, muitas teorias começaram a se formar. A que prevaleceu ao decorrer das décadas é que a simplicidade e humildade do trabalhador estrangeiro o fizeram merecedor de encontrar o grandioso e misterioso tesouro do Morro do Pão de Açúcar.